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Desafios e perspectivas para o produtor rural: aumento significativo nos pedidos de recuperação judicial

Advogados ressaltam os motivos e aspectos jurídicos dessa ação

Por Tany Souza

Segundo levantamento da Serasa Experian, houve aumento de pedidos de recuperação judicial em 2023, com alta de 68,7% em comparação a 2022. Ao todo, foram 1.405 pedidos ao longo do ano, o 4º índice mais alto registrado desde o início da série histórica, em 2005, e o maior valor desde 2020.

A crescente nos casos acende o alerta para as questões jurídicas inerentes a estes pedidos. A sócia da área de Reestruturação e Insolvência do Cescon Barrieu, Cinthia de Lamare, esclarece que a legislação atual admite o pedido de recuperação judicial pelo produtor rural, inclusive pessoa física, que exerça a atividade de forma empresarial há mais de dois anos.

“Durante algum tempo se discutiu se o registro como produtor rural na Junta Comercial deveria ser comprovado pelo período mínimo de dois anos, mas, recentemente, o STJ admitiu, em recurso repetitivo, que bastaria a comprovação do registro no momento do pedido de recuperação judicial”, comenta Cinthia.

Cinthia de Lamare

Segundo ela, essa flexibilização da regra pegou muitos credores de surpresa, pois, em alguns casos, no momento da concessão do crédito, não existia esse registro como produtor rural e a consequente possibilidade de pedido de recuperação judicial da pessoa física. “Muitas operações de crédito estruturadas a partir de garantias outorgadas por pessoas físicas acabaram seriamente impactadas por pedidos de recuperação judicial que impossibilitaram a excussão de tais garantias”, comenta a advogada.

O pequeno produtor rural pode se valer do plano especial de recuperação judicial, desde que o valor da recuperação judicial não exceda R$ 4,8 milhões. Na prática, por se tratar de um processo custoso, ainda é mais comum se ver processos de recuperação envolvendo valores superiores àqueles que possibilitam a apresentação do plano especial.

Leonardo Dias.

Há diversos fatores que podem levar o produtor rural a pedir recuperação judicial, de acordo com o advogado Leonardo Dias, head de Contencioso, Arbitragem e Insolvência do Marcos Martins Advogados. “Há uma clareza maior sobre a possibilidade desse pedido e sobre as regras aplicáveis após a reforma da lei de recuperação de empresas e falências no final de 2020. Fatores externos, como o El Niño, também trouxeram prejuízos para a safras em termos de produtividade, bem como variações nos preços das commodities e seletividade na disponibilização de crédito”.

Leonardo Dias comenta outros fatores internos, como o grau de endividamento de cada produtor rural. “Dificuldades para rolar dívidas – muitas das quais já renegociadas durante a pandemia -, aumento de execuções e de atos expropriatórios pelos credores. Enfim, a conjugação de todos esses fatores pode ser apontada como causa para o aumento dos pedidos de recuperação judicial por produtores rurais”.

De acordo com Daniel Báril, coordenador da área de Insolvência e Reestruturação do Silveiro Advogados, em qualquer economia madura, existe um número natural de recuperações judiciais, decorrente do fato dela ser um bom ‘remédio’ para determinados tipos de crises.

“No período da covid, por exemplo, as empresas carregaram passivos altos, mas pouca coisa aconteceu em termos de ‘Distressed’, porque as cobranças, de certa forma, foram postergadas. Foram criados novos financiamentos pelo governo e, a partir desses financiamentos, as empresas ganharam um fôlego, mas a conta um dia chega. As dívidas começaram a vencer e as taxas juros no Brasil não são baixas”, comenta o advogado.

Daniel Báril.

A recuperação judicial é apenas uma, dentre as tantas ferramentas existentes para socorrer negócios em crise. “Um negócio pode, por exemplo, passar por capitalização para resolver problemas de endividamento; pode ser vendido, trocar os controladores, aumentar sua capacidade de financiamento. Há empresas que farão uma recuperação extrajudicial, que é uma dinâmica mais simplificada, cuja negociação deve acontecer antes do seu protocolo. Há no Brasil inúmeras formas de se recuperar uma empresa, mas a recuperação judicial tem sido bastante comentada e utilizada, porque é uma ferramenta que faz todo sentido para determinados perfis de endividamentos”, finaliza.

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