Seguro agrícola e paramétrico: caminhos da proteção no campo
- 7/ outubro / 2025
Enquanto o seguro agrícola cobre perdas reais de produtividade com vistoria em campo, o seguro paramétrico aposta na tecnologia e na agilidade, mas ainda enfrenta desafios de base e de aderência no Brasil
Por Tany Souza
A busca por soluções eficazes para mitigar os riscos do campo tem levado o setor de seguros a ampliar suas ofertas e explorar novos modelos de proteção. Nesse cenário, os seguros agrícolas tradicionais e os seguros paramétricos têm ganhado destaque — cada um com suas vantagens, limitações e particularidades.
De acordo com Luciano Pioli, especialista e consultor em seguros agrícolas da Camais & Parcerias, e sócio da Almanza, a principal diferença entre os dois modelos está no processo de indenização. “No seguro tradicional, a indenização é feita após a colheita, com vistoria e pesagem da produção. Isso pode gerar divergências, já que fatores como impurezas e umidade precisam ser abatidos”, explicou. Segundo ele, o seguro paramétrico, por outro lado, funciona de forma mais direta: “Ele é baseado em índices pré-estabelecidos de chuva ou seca. Se o índice for atingido, a indenização é paga automaticamente, sem necessidade de vistoria ou espera pela colheita.”
Complexidade e aderência no campo
Para Antonio Américo, corretor de seguros e produtor rural, a diferença básica está nas coberturas e na forma de apuração das perdas. “O seguro agrícola é multirriscos — cobre seca, granizo, geada, entre outros — e considera a produtividade real da área segurada. Já o paramétrico é baseado em índices, o que o torna mais simples, mas também menos preciso em algumas situações”, destacou.
Américo explicou que o seguro agrícola utiliza médias históricas de produção dos últimos cinco anos e pode garantir o valor da saca, tonelada ou arroba, conforme a cultura. “Essa modalidade permite uma defesa mais efetiva contra o prejuízo real. No paramétrico, há o chamado risco de base — um desvio que pode ocorrer porque o cálculo é feito a partir de dados de satélite. Dependendo do tamanho do grid, o produtor pode ter perda na propriedade, mas não receber indenização se o índice da região não atingir o gatilho contratado.”
Apesar das limitações, o corretor ressalta que o paramétrico tem vantagens em flexibilidade e transparência. “O produtor pode acompanhar o andamento da apólice por aplicativo, e o sinistro é avaliado automaticamente ao final do período de cobertura. Não há perícia em campo, o que torna o processo mais ágil”, observou.
Na avaliação de Camila Feriani, Diretora Comercial da Specialty de Agro, Alimentos & Bebidas da Lockton Brasil, o paramétrico tem papel complementar, mas ainda depende de amadurecimento do mercado. “Enquanto o seguro agrícola cobre a perda real do produtor, o paramétrico se baseia em índices previamente definidos. É mais ágil e transparente, com custo operacional menor, mas ainda enfrenta desafios de personalização e de confiabilidade dos dados”, afirmou.
Camila reforça que o modelo não deve substituir o seguro agrícola, mas atuar como um aliado. “O paramétrico exige conscientização e maturidade do produtor, além de investimento em tecnologia e entendimento sobre sua área de produção. Em outros países, ele já está consolidado, especialmente para catástrofes naturais, mas no Brasil ainda caminha a passos lentos”, concluiu.
Assim, o seguro agrícola permanece como o pilar principal da proteção rural, garantindo cobertura mais ampla e aderente à realidade do campo. Já o paramétrico surge como uma alternativa moderna, com foco em agilidade e previsibilidade — dois conceitos que, somados, podem fortalecer a segurança e a resiliência do agronegócio brasileiro.
Desafios legais e o princípio indenitário
Sob a ótica jurídica, o avanço do seguro paramétrico no país ainda enfrenta barreiras regulatórias e conceituais. Segundo Juliano Ferrer, presidente do Grupo Nacional de Trabalho de Agronegócio e Seguros da AIDA Brasil, há uma diferença essencial entre o seguro paramétrico e o seguro agrícola tradicional. “No seguro de custeio e produtividade, a indenização é feita com base em uma avaliação do dano efetivo, constatado em perícia. Já o paramétrico é baseado em índices climáticos — como chuva, seca ou granizo — e a indenização ocorre automaticamente quando o índice pactuado é atingido, independentemente da existência de dano real”, explicou.
Ferrer aponta, contudo, que essa característica pode entrar em conflito com o princípio indenitário, base do direito securitário brasileiro. “Nosso arcabouço legal considera o seguro agrícola como um seguro de danos, e no paramétrico o dano deixa de ser o elemento central. Isso pode gerar questionamentos jurídicos, já que, em alguns casos, o produtor pode sofrer prejuízo e não receber a indenização por não atingir o índice, ou receber sem ter tido dano algum”, destacou.
Para o advogado, o futuro dessa modalidade depende de avanços regulatórios e de uma pactuação clara entre seguradoras e produtores. “A comercialização massificada ainda é complexa, pois os índices precisam ser muito bem definidos para evitar litígios. É um modelo promissor, mas que exigirá debate jurídico e amadurecimento do mercado antes de ganhar escala no Brasil”, concluiu.
Assim, o seguro agrícola permanece como o pilar principal da proteção rural, garantindo cobertura mais ampla e aderente à realidade do campo. Já o seguro paramétrico surge como uma alternativa moderna e tecnológica, que, embora traga agilidade e previsibilidade, ainda precisará evoluir em segurança jurídica para conquistar a confiança plena do produtor brasileiro.